Os caminhos do Ceará para institucionalizar o monitoramento e a avaliação de políticas públicas na gestão do estado

11 de agosto de 2021 - 12:08

Com um trabalho iniciado há três décadas, o Ceará tem se mostrado um dos mais ordenados na gestão fiscal. Também é destaque no ensino público, com um grupo de políticas da qual fazem parte apoio técnico e incentivos tributários condicionados à melhora de desempenho dos alunos que colocou o estado entre os primeiros lugares do ensino fundamental no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). O que ainda poucos sabem é que, há cerca de quatro anos, o Ceará tem se empenhado em se tornar referência em outra área: a de monitoramento e avaliação de políticas públicas.

Um dos nomes que está à frente desse processo é João Mario de França, diretor geral do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece), autarquia ligada à secretaria de Planejamento. Em 2018, o Ipece criou o Centro de Análise de Dados e Avaliação de Políticas Públicas (CAPP), com o objetivo de avaliar políticas em três dimensões: propostas de projetos; avaliação executiva de programas em andamento, e avaliação de impacto. O diretor do Ipece conta que a criação do CAPP se deu para apoiar o modelo de gestão para resultados institucionalizado pelo governo estadual um ano antes, em 2017. “Foi um momento de mudança de paradigmas, com a formação de um ambiente político voltado ao uso de evidências na gestão pública”, conta França.

O CAPP é formado por grupos de pesquisa e um Cientista-Chefe – figura criada pela Fundação Cearense de Amparo à Pesquisa (Funcap) visando à incorporação de pesquisadores universitários na gestão pública, hoje presente em diversas secretarias do estado. No caso do CAPP, o cientista-chefe é um professor de Física da Universidade Federal do Ceará, que colabora na elaboração de modelagens matemáticas para a análise de dados. “Essa é uma iniciativa muito importante, que gera externalidades positivas tanto para o governo quanto para a academia cearense”, diz França. Além desse intercâmbio, o Centro também conta com acordos de cooperação com outras instituições – como a FGV EESP (pelo programa Clear) e a Rice University, de Houston (EUA) -, na estruturação operacional. Com essa formatação, eles iniciaram suas atividades e, somente em avaliações executivas realizadas em 2018 e 2019, atuaram em sete programas de diversas secretarias, entre elas as de Educação e Desenvolvimento Agrário. O grande impulso para o trabalho do CAPP se deu, entretanto, no final de 2019, quando um decreto do governo estabeleceu que todos os projetos envolvendo recursos do Fundo Estadual de Combate à Pobreza (Fecop) – que opera pouco mais de meio bilhão de reais ao ano – deveriam passar por uma avaliação prévia do CAPP. “Desde então, nossa atividade ganhou mais dinamismo, e caminhamos efetivamente para a criação de uma cultura de avaliação e monitoramento”, afirma França.

Somente em 2020, foram avaliados 70 projetos, e até junho de 2021, o CAPP já somava outras 57 avaliações. França explica que dessa lista constam tanto programas novos quanto aqueles que demandam renovação anual. A análise feita pelo CAPP conta com dez quesitos, e a nota mínima que o projeto precisa obter para ser encaminhado ao conselho do Fecop, responsável pela aprovação, é 6. “Caso não consiga, o projeto volta à secretaria responsável, para que faça ajustes e volte a apresentá-lo”, descreve França. O diretor do Ipece conta que o maior desafio encontrado pela equipe do CAPP tem sido quebrar a resistência inicial dos gestores públicos quanto ao processo de avaliação. “Mas buscamos a construção de uma relação tranquila e cooperativa, explicando a natureza das avaliações, que tem resultado em um grande processo de aprendizagem”, afirma. França conta que mesmo projetos com nota suficiente para aprovação em 2020 melhoraram sua nota na avaliação de 2021, refletindo a incorporação de sugestões feitas pelo CAPP no ano anterior. “A tendência é que, com isso, esses programas tragam melhores resultados, que é o objetivo do estado.”

No campo das avaliações executivas, um dos programas que estão na lista de análise do CAPP é o Cartão Mais Infância, que transfere R$ 100 mensais a famílias com renda per capta inferior a R$ 89 (excluso Bolsa Família) que possuem crianças até 5 anos e 11 meses de idade. A iniciativa está sob o guarda-chuva do Programa Mais Infância Ceará, criado em 2015, que conta com outras frentes que vão do auxílio pré-natal (Projeto Nascer no Ceará) e o acompanhamento e orientação para pais e mães de crianças com até 3 anos e 11 meses (Padin) à criação de centros pedagógicos e oferta de apoio nutricional. França conta que, quando iniciado, em 2019, o Cartão Mais Infância atendia 47 mil famílias. “Hoje o número de famílias beneficiadas chega a 110 mil, com previsão de alcançar 150 mil até o final do ano”, afirma, lembrando que o impacto da pandemia na renda de várias famílias colaborou para esse aumento. Com tamanha expansão em três anos de vida, o governo identificou a necessidade de se acompanhar a execução e gestão do mesmo, com o apoio da Secretaria de Proteção Social e do gabinete da primeira-dama, que estão à frente do programa. “A ideia é analisar a execução financeira, o desenho de avaliação, se o planejamento está funcionando bem, a presença de instrumentos de percepção de beneficiários, entre outros pontos. Dada a importância dessa política pública, que trata de garantir qualidade de vida a essas crianças que hoje vivem em vulnerabilidade, e da primeira infância no desenvolvimento de qualquer pessoa, buscar melhores resultados sempre será positivo”, conclui França.

Fonte: Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro – Blog da Conjuntura Econômica ( FGV-IBRE ).
Link: https://ibre.fgv.br/blog-da-conjuntura-economica/artigos/os-caminhos-do-ceara-para-institucionalizar-o-monitoramento-e